sábado, 30 de novembro de 2013

Tenhamos Compaixão das Pobres Almas! — 27 de Novembro: As aparições de almas do purgatório (Parte XXVIII)



Nota do blogue:  Acompanhe esse Especial AQUI.

Tenhamos Compaixão das Pobres Almas!
30 meditações e exemplos sobre o Purgatório e as Almas
por Monsenhor Ascânio Brandão

Livro de 1948 - 243 pags
Casa da U.P.C.
Pouso Alegre







27 de Novembro

AS APARIÇÕES DE ALMAS DO PURGATÓRIO


Que são as aparições?


Contam-se fatos prodigiosos e muitas aparições de almas do purgatório. Isto poderia talvez impres­sionar a alguns e julgarem que podemos desejar ou procurar, com certa curiosidade, indagar a sorte dos mortos ou facilmente ter comunicação com as almas do purgatório. Quanta ilusão perigosa e quanta su­perstição e crendice em torno disto! É mister discer­nirmos bem as verdadeiras das falsas aparições, e mostrarmos o pensamento da Igreja e dos Santos Doutores para que se evitem confusões e ilusões nu­ma matéria tão grave e delicada, porque tão sujeita a enganos e erros.

Que é uma aparição? É uma manifestação do outro mundo, de alguém que nos vem dizer o que lá se passa. Podemos acreditar nas aparições?

Há dois extremos igualmente prejudiciais. Um dos que facilmente aceitam toda sorte de aparições sem exame e não têm a prudência de estudar e esperar a opinião de pessoas criteriosas, teólogos ou autoridades eclesiásticas e superiores, que possam dis­cernir com segurança a verdade de tais aparições. É uma leviandade. Assim o diz a Escritura: “Qui cito credit, levis est corde”[1], quem facilmente em tudo crê, é leviano de coração, é um espírito leviano. Todavia, rejeitar sistematicamente e obstinadamente toda aparição, todos os fatos sobrenaturais, mesmo que tenham os sinais de verdadeiros, é prova de mui­to ceticismo, de orgulho, e pode levar à infidelidade a graça, como insinua a Escritura: “Qui incredulus est infideliter agit”[2], quem é duro em acreditar, procede contra a piedade.

É mister um equilíbrio neste caso entre os dois extremos. Uma alma verdadeiramente humilde e obe­diente nunca poderá se enganar. Outra questão é se as almas do outro mundo podem se comunicar com os vivos. Podem voltar à terra quando queiram ou quando desejem os vivos? Respondemos sem hesitar, com a boa doutrina da Igreja e dos teólogos: — não e não! Isto só se dá por uma especialíssima permis­são de Deus, raras vezes, e por milagre, para ensina­mento e confirmação da imortalidade da alma, para lição dos vivos ou para pedir socorro e sufrágios.

Desde que nossa alma se separou do corpo pela morte, não tem mais órgãos para se comunicar com os homens, é puro espírito, e só por milagre se pode tornar sensível. E demais, quando a alma deixou o corpo, já foi entregue à Divina Justiça, e está no lu­gar que mereceu: o céu, o inferno ou o purgatório. Não pode, sem milagre, entrar em comunicação com os homens. Este milagre das aparições nós os encontramos na Sagrada Escritura. Samuel apareceu à Pitonisa de Endor e repreendeu a Saul porque havia perturbado o repouso dos mortos. Mostrou o castigo que lhe estava reservado por esta curiosidade vã. Na morte de Nosso Senhor, conta São Mateus que os túmulos se abriram e muitos mortos apareceram e foram vistos em Jerusalém. Nas vidas dos Santos encontramos inúmeras aparições, e a Santa Igreja, ao elevar à honra dos altares os servos de Deus, sub­mete a um rigoroso processo todos os fatos e prodí­gios que deles narraram, embora não se pronuncie sobre eles. Portanto, há verdadeiras aparições.


Verdadeiras e falsas aparições

Há verdadeiras e falsas aparições. Estas muito mais frequentes do que aquelas. Como distingui-las? Há sinais pelos quais facilmente podemos nos livrar de enganos e afastarmos o perigo da ilusão diabólica. Devemos imitar sempre a reserva prudente da Santa Igreja nesta matéria. A Igreja não admite revelação alguma se não for devidamente comprovada, e ainda assim, não obriga os fiéis a nela acreditar. Ninguém é obrigado a acreditar numa revelação particular por mais provada que tenha sido. Não obstante, depois de bem provadas, seria temerário abusar com uma sistemática atitude de ceticismo, diante do que San­tos e homens doutos e equilibrados aceitaram e pro­varam não haver ilusões.

Diz Bento XIV que podem os fiéis acreditar e podem ser publicadas as revelações particulares para edificação dos fiéis, contanto que sejam aprovadas pela autoridade eclesiástica. O Papa Urbano VIII manda que ao serem publicadas, declare o autor em nada querer se adiantar aos juízos da Igreja, e que tais fatos merecem apenas uma fé humana e não im­portam em definição da Santa Madre Igreja.

Eis as cautelas com que a Igreja cerca as apa­rições.

Há também regras seguras para discernimento das revelações segundo os bons autores de espiritua­lidade e os melhores teólogos. Umas se referem às pessoas que recebem as revelações, e outras à ma­téria das revelações e aos efeitos das mesmas. Quan­to às pessoas é mister indagar dos dotes naturais. É um temperamento equilibrado? Não se trata de uma psico neurose ou de histerismo? Nestes casos, quan­tas alucinações perigosas e difíceis de serem discer­nidas logo de começo! Quanto ao estado mental, é pessoa discreta, de juízo reto, ou de imaginação exal­tada e de sensibilidade excessiva? É instruída ou ig­norante? Onde aprendeu o que sabe? Não estaria com o espírito debilitado por jejuns ou por alguma enfer­midade? Quanto a moral, é mister saber se trata-se de pessoa sincera ou acostumada a exagerar e a mentir. É um temperamento calmo, ou apaixonado e sem equilíbrio? A resposta a estas perguntas não dará, certamente, uma solução para a prova da exis­tência ou não de uma revelação verdadeira, mas aju­dará muito a julgar do valor do testemunho dos videntes.

Quanto à matéria das aparições é mister muita atenção para julgá-las. Segundo a doutrina unâni­me dos Doutores, nenhuma revelação pode contradi­zer o dogma e o que foi ensinado pelo Evangelho. Diz São Paulo: “Ainda que um Anjo do céu vos pregue um evangelho diferente do que anunciamos, seja aná­tema”[3]. Deus não se contradiz. Nas falsas apari­ções há mentiras, erros teológicos graves, contradições, e muitas vezes coisas contrárias às leis da mo­ral e da decência.

Muitas pessoas de imaginação muito viva tomam seus próprios pensamentos por visões e locuções in­teriores. Dizia Santa Teresa: “Acontece com certas pessoas de tão fraca imaginação que se embebem de tal maneira na imaginação, que tudo o que pensam claramente lhes parece que estão vendo”[4].


Aparições das almas do purgatório

Depois de termos mostrado a verdadeira doutri­na da Igreja sobre as revelações ou aparições, trate­mos das aparições das santas almas. Podem elas aparecer aos homens? Sim, raramente e por permis­são de Deus. É uma graça para quem recebeu a apa­rição e uma graça para a pobre alma, sobretudo quan­do Deus permite que ela obtenha socorros para se livrar das chamas expiadoras. Deus o permite para excitar a nossa fé na imortalidade da alma e para que compreendamos melhor a sorte das pobres almas e procuraremos sufragá-las com mais zelo e carida­de. Como distinguir as verdadeiras das falsas apari­ções de almas do purgatório? Já demos as principais regras deste discernimento segundo a doutrina da Igreja e a teologia. Acrescentemos mais algumas. No século XVII o sábio Cardeal Bona criticou seve­ramente a facilidade e leviandade com que acredita­vam muitos em revelações sobrenaturais e deu algu­mas regras que podem nos esclarecer muitos na ma­téria. Vamos comentá-las:

“1.º — ‘Toda aparição desejada ou provocada é suspeita’. Ninguém deve desejar ver nem conver­sar com os mortos, indagar a sorte dos defuntos, mesmo que o faça por motivo de caridade e para rezar por eles. Não se deve desejar aparição alguma de alma do purgatório. Seria temeridade e presunção.

2.º — Se a aparição revela coisas ocultas que se­ria melhor silenciar sobre elas, faltas alheias, ensina coisas contrárias ao dogma e ao Evangelho, tem hor­ror à água benta, ao crucifixo etc., está provado que se trata do Demônio.

3.º — As almas do purgatório aparecem geral­mente para solicitar orações, recomendar restituições, etc. E feito isto, não voltam mais, a não ser para agradecerem. Se uma aparição se torna importuna dia e noite, ameaça, perturba a paz de um homem ou de uma família ou comunidade, é sinal certo de demônio.

4.º — Ninguém deve aceitar serviços prestados pelas almas do purgatório que se vem colocar à nossa disposição, morar conosco, etc. É pura ilusão isto ou coisa diabólica.

5.º — Todos os bons teólogos místicos ensinam que as aparições verdadeiras logo de princípio per­turbam e assustam, mas depois lançam a alma numa doce paz, aumenta a humildade, excita o amor de Deus e do próximo e produzem um grande desejo de per­feição. Quando alguém começa a se gabar das apa­rições, mostrar-se digno delas, perturbar-se em vão e encher-se de presunção, irritar quando os superiores não fazem caso das suas visões e desobedecerem, eis um sinal bem certo de engano.

6.º — É mister que as aparições sejam expostas singelamente a um bom diretor, sem exageros nem reticências, nem diminuição da verdade. E depois fi­car pelo que ele decidir e obedecê-lo cegamente”.

Com estas regras seguras dos bons teólogos e autores místicos, não haverá perigo de ilusão. Deus Nosso Senhor na sua misericórdia tem permitido muitas revelações das almas do purgatório. Parece mesmo que são mais numerosas do que qualquer ou­tras. Quanta luz sobre o purgatório não nos deram, por exemplo, as revelações de uma Santa Catarina de Genova! Nesta matéria sejamos muito prudentes e criteriosos e não nos afastemos do pensamento da Santa Igreja e das normas que acima vão expostas.


Exemplo

O purgatório nas visões de uma mística canadense


Em 14 de Março de 1910 faleceu na cidade de Pointe Claire, no Canadá, uma mulher extraordiná­ria, santa mãe de família, um modelo de esposa e cris­tã verdadeira, Madame Brault, Maria Luiza Richard. A publicação da vida extraordinária e maravilhosa desta grande mística, há bem pouco, causou sensação em todo mundo, tais os prodígios contados e provados desta mulher que se pode enfileirar ao lado de Ana Taigi e das grandes místicas da Igreja. Dotada de uma grande simplicidade, espírito bem equilibrado e sensato, de uma piedade muito provada e sincera, ho­je está perfeitamente averiguado que não se tratava de nenhum espírito mistificador nem de alguma fal­sa visionária. Teólogos e prelados ilustres examina­ram fatos, confessores doutos e esclarecidos depuseram como testemunhas fidedignas no exame dos fa­tos impressionantes da vida maravilhosa desta gran­de mística de nosso século. Madame Brault tinha contato com as almas do purgatório e como o Santo Cura d’Ars podia dar testemunho da sorte das pobres almas. Dizia ela chorando, num dia de Finados: “Os egoístas da terra se esquecem dos mortos. Como deve ser cruel para as pobres almas do purgatório o aban­dono dos homens! Dizem que amam os pais e paren­tes defuntos! Que mentira! Nós que amamos a Deus devemos amar nossos amigos do purgatório todos os dias de nossa vida. Eu quisera ser capaz de sofrer sozinha tudo o que padecem as almas do purgatório para poder libertá-las!”.

Madame Brault teve muitas visões das almas do purgatório. Elas lhe pediam orações, Missas e sacrifí­cios. As pessoas que ela via eram desconhecidas às ve­zes e fizeram inquéritos rigorosos de datas, lugares e circunstâncias, chegando-se à conclusão da impossibili­dade de qualquer mistificação. Eram impressionantes as revelações desta mística. Em 1905, uma religiosa acompanhada de outra foi visitar Madame Brault.

— “Não quero visitar esta louca”, disse a Mestra de noviças.

— “Ó, minha Irmã, não diga assim! Madame é tão equilibrada e santa, tão discreta e humilde!”

Afinal tiveram uma entrevista com ela. Foi uma pa­lestra amável e singela. Depois de alguns instante, Madame Brault chamou a Irmã e lhe disse:

— “Minha Irmã, a senhora não reza mais por seus parentes falecidos?”.

— Meus parentes morreram há muito tempo e eram muito bons, devem estar no céu.

— Sim, vosso pai e vossa mãe estão no céu. Um irmão porém morreu repentinamente em tal lugar e em tal data, e um sobrinho. E a senhora nunca mais rezou por eles. É preciso dizer ao sobrinho que vai se ordenar, que diga logo algumas missas por seu tio.

A Religiosa pasmou diante do que ouvira. Era impossível que Madame tivesse tido informações tão fiéis de seus parentes. Outra Irmã perdera o pai em 31 de Julho de 1903. Madame Brault lhe disse: “Te­nha confiança, Irmã, seu pai está no céu. Tinha ele uma grande devoção à Santíssima Virgem, gostava de rezar o rosário e morreu num sábado. Naquele sá­bado mesmo Nossa Senhora o fez entrar no céu”.

Ela nunca ouvira falar deste homem, e não lhe era possível conhecer tal pessoa.

“Sejamos libertadores das almas do purgatório, repetia ela depois dos êxtases. Nosso Senhor nos deu as chaves da prisão do purgatório: a oração, o sofri­mento, o sacrifício...”.

No dia 21 de Dezembro de 1907, na relação que foi obrigada a fazer por escrito ao seu Diretor espi­ritual, viu ela um Padre no purgatório. Estava re­vestido de ornamentos sacerdotais e com um cálice todo em fogo. As mãos pareciam roídas e apareciam até os ossos. Úlceras por todo o corpo e torturas hor­ríveis. À vista deste tormento, Madame Brault ge­meu: “Ó meu Bem Amado, meu Jesus, quero sofrer por esta alma; por que não me dais a graça de sofrer mais para aliviá-la? Depois vi Jesus se aproximar do Padre e derramar sobre aquelas chagas seu precioso Sangue. As chagas se cicatrizaram e as cadeias do pobre sacerdote caíram. Depois meu Jesus me disse que libertaria aquela alma pelas minhas orações. A face do padre ficou limpa das úlceras, uma bela esto­la roxa lhe adornava o pescoço e os paramentos me pareceram mais brilhantes e belos. Jesus me dis­se que libertaria a alma do sacerdote”.

No dia de Finados de 1908, foi ao cemitério rezar pelos mortos e viu, Madame Brault, muitos mortos que lhe apareciam saindo das sepulturas em queixas do­ridas de cortar o coração: Estamos esquecidos de nos­sos parentes! Não rezam por nós! Nossos amigos nos esqueceram, nos abandonaram!!!

Fez ela uma Via Sacra pelos defuntos e se reti­rou muito amargurada, pelo esquecimento dos po­bres mortos.

“Compreendo, dizia ela ao confessor, o martírio das pobres almas nas chamas do purgatório!”. Viu um padre conhecido no purgatório que lhe disse: “Eu sofro muito por ter rezado tantas vezes meu breviário quase sem pensar que falava com Deus e por ro­tina, e também pela minha pouca preparação e ação de graças muito rápida depois da Santa Missa”.

Enfim, seria longo narrar as impressionantes vi­sões do purgatório de Madame Brault, a grande mís­tica de nossos dias. A biografia desta mulher extraor­dinária foi publicada pelo Pe. Louis Bouhier, S. S., an­tigo pároco da vidente. É a obra “Une mystique ca­nadienne — Vie extraordinaire de Madame Brault” — Edition Beauchemin, 1941.


[1] Eccl. XIV — 4.
[2] Isaías — XXI, 2.
[3] Galatas — I, 8.
[4] Castillo — Morados sextas — Cap. IX, 9.

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